Fico com essas palavras envoltas em meu manto de canto: os silêncios são compostos líquidos, corroem o tempo com sua estrutura de aço e linho, sacodem o pó da terra, retiram de mim o que há de estranho. Cântico e silêncio: escrevo com vestes de quem partiu, de quem se foi, mas que está a espreitar um tempo.
Não mistifico a vida, não há o que se fazer, nem mesmo o tango argentino seria agradável. Escuto o que há para escutar: vazio. Recolho, então, meus papéis (nos quais o tempo se insere, sinuoso) e arranco e arranho e arrisco dizer: tempo-matéria, coisa opaca, estranhamento de dias. Faço de tudo para não fazer e como um barco a velas, um barco à deriva, me sinto porto em pátria desconhecida.
Desconexos desencantos em minha volúpia. E canto e digo e sou: arquivista de negação.
Morre e espreita, barco e cais.
Negação seria a possibilidade zero e você dança entre o que sente e tão bem expressa.
Há movimento aí – de opostos e de balanço.
Não sou boa na arte de traduzir o outro, por isso o outro me causa este estranho e agradável encantamento.
É sempre este ser místico, mesmo que negue ser, este ser incognoscível que me inspira!
[…] um sol para linhas – amar, mar, amar és, amar és, linhas. Amarelinhas: cor de vida, sensação lubridiante que embalsama os olhos, que às vezes de tão clara indica o excesso da ausência, não ausência da tua presença, mas aquela que me impede de te consumir.
Já me desconheço, embora me encontro várias vezes ao dia em ti. És a minha extensão. Sim. És. Quem me vira em frege, mas ao rodopio, segura minha mão e caminha, ora em frente, ora atrás, ao lado, abaixo e acima. Uma carta inquieta girando ao meu redor. Anda um caminhar descompasado, se perde e me invade com passos levementes austeros. E por que assim és. Levemente Mar És, me vejo refletida em tudo, até em teus desassossegos. Não, não nego, apenas reflito, me entrego e me esvazio. É aonde chove que te espero. É nesses nossos ventos difusos que nos encontramos. E eu amo tanto[…]
Errata:
descompassado*